Embaixador da China rebate críticas sobre aço e desafia indústria do Brasil a ‘sair da zona de conforto’

Embaixador da China rebate críticas sobre aço e desafia indústria do Brasil a ‘sair da zona de conforto’

O embaixador da China no Brasil, Zhu Qingqiao, rebateu as críticas de siderúrgicas, montadoras e fabricantes de máquinas e equipamentos de que o país asiático estaria inundando o mercado com produtos subsidiados e provocando a desindustrialização no Brasil. Em resposta, ele desafiou a indústria nacional a “sair da zona de conforto” e buscar maior eficiência e inovação.

Em entrevista ao Valor, o diplomata afirmou que a competitividade chinesa resulta da escala de produção e da eficiência industrial, e não de subsídios estatais. Segundo ele, em vez de reclamar, é preciso adotar uma postura de solidariedade e cooperação, já que Brasil e China têm economias complementares. Zhu fez ainda um apelo aos empresários brasileiros para visitarem a China e conhecer de perto o modelo e os métodos de produção.

“Quantos empresários conhecem a China? Quais são? Quando visitaram a China? Precisam sair da zona de conforto (...), fazer comparações, introduzir novas tecnologias. Em vez de se queixarem, precisam fazer alguma coisa para aumentar a competitividade e explorar o mercado conjunto”, disse.

Alguns segmentos industriais dizem que o país asiático deixou de exportar apenas insumos básicos e passou a avançar também com produtos de maior valor agregado, competindo diretamente com outras indústrias locais. Por isso, cobram que o governo brasileiro seja mais firme em medidas de defesa comercial.

Zhu afirmou que medidas de defesa comercial, para ele, acabam sendo como protecionismo, que atrapalham o sistema internacional multilateral e o comércio global. Ele defendeu que Brasil e China são economias complementares e compartilham a defesa do multilateralismo, sobretudo num cenário de incertezas globais.

A declaração ocorre em meio à intensificação do debate sobre o aço importado, depois que o Instituto Aço Brasil, a Abimaq e a Anfavea — entidades que representam os setores de siderurgia, máquinas e equipamentos e montadoras — acusaram o governo chinês de adotar práticas comerciais desleais.

Cotas e investigação antidumping

O tema ganhou novo fôlego após o Brasil renovar, até 2026, o sistema de cotas e a tarifa de 25% sobre o aço que exceder o limite de importação, além de abrir uma investigação antidumping envolvendo 25 produtos de origem chinesa.

O governo brasileiro tenta equilibrar os interesses de setores que pedem proteção e o peso da parceria estratégica com Pequim. A China é o maior parceiro comercial do Brasil, enquanto os Estados Unidos — críticos do modelo chinês — mantém tarifas altas sobre o aço brasileiro.

Para Zhu Qingqiao, o caminho passa por calibrar medidas defensivas sem abandonar a cooperação. “O Brasil e a China devem trabalhar juntos, aproveitando suas vantagens comparativas. Essa é a forma mais sustentável de proteger a indústria nacional”, concluiu.

"Visitem a China"

O diplomata destacou que poucos empresários brasileiros visitaram a China para conhecer como o país construiu, segundo ele, o parque industrial mais completo do mundo. Na avaliação do representante chinês, a integração produtiva sino-brasileira pode trazer ganhos mútuos, desde que o Brasil invista em eficiência e inovação. “Há muitas oportunidades para as empresas brasileiras, mas é preciso abrir-se a novos modelos de produção”, afirmou.

O presidente do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC), Luiz Augusto de Castro Neves, endossou a posição do embaixador e afirmou que o protecionismo deixou de ser eficaz na economia globalizada. “A internacionalização dos processos produtivos tornou o protecionismo um instrumento ineficiente. Ele apenas encarece o produto final e reduz competitividade”, disse.

Para Castro Neves, é um exagero das siderúrgicas afirmar que o aço chinês destrói a indústria nacional. Ele defende que o país busque complementaridades com a China, explorando a participação de insumos e peças chinesas na produção local “e não apenas ter a sua viabilidade econômica garantida por subsídios, por protecionismo e por reserva de mercado”.

Em relação à indústria automobilística brasileira, o dirigente frisa que o setor foi implantado no pós-guerra, mas “nunca conseguiu ser competitiva externamente. Na verdade, a gente importava bens de capital já amortizados nos seus países de origem e fabricava um carro tecnologicamente atrasado, caro e para uso apenas no mercado interno”, disse.

 
Fonte: Valor
Seção: Siderurgia & Mineração
Publicação: 16/10/2025