Importação de aço fora do sistema de cotas mais que triplica no Brasil e expõe brechas na regra

Importação de aço fora do sistema de cotas mais que triplica no Brasil e expõe brechas na regra

A importação de tipos de aço não sujeitos ao regime brasileiro de cota-tarifa disparou no último ano. De junho de 2024, quando a medida entrou em vigor, até março deste ano, o Brasil importou 318.968 toneladas desses produtos — um aumento de 258% na comparação com o mesmo período entre 2023 e 2024 (89.082 toneladas).

Os dados são do Instituto Aço Brasil e consideram dez itens classificados como “NCMs de fuga” ? produtos que diferem apenas levemente de outros mais taxados, permitindo que importadores escapem das tarifas mais altas. Na prática, é como se a medida comercial imposta pelo governo tivesse “vazamentos”. NCM é a sigla para Nomenclatura Comum do Mercosul, um código que identifica e classifica os produtos comercializados na região.

No caso de nove tipos de aço sujeitos à tarifa mais elevada para importações fora da cota, as compras externas recuaram 7,4%, passando de 1.985.399 para 1.839.211 toneladas. Apesar da queda no acumulado do período, houve uma forte alta pontual entre dezembro e janeiro, quando as importações saltaram 166,5%.

Para o setor, o recuo de 7,4% é pouco significativo se considerado o contexto geral. Comparada a média de 2020 a 2022, as importações totais de laminados na siderurgia devem avançar 75% em 2025, prevê a Aço Brasil. De 2023 para 2024, a alta foi de 8,6%.

Como mostrou o Estadão/Broadcast na última sexta-feira, 11, a siderurgia teme uma piora neste quadro depois de Donald Trump impor uma tarifa de 25% sobre o aço que entra nos EUA. A decisão deve fazer com que mais países desviem suas exportações para o Brasil, até agora majoritariamente comprador do aço chinês.

Um dos mercados que fazem as empresas sediadas aqui ligarem o alerta é o da Coreia do Sul, além de outros asiáticos. Mas a preocupação vem de praticamente todas as partes do mundo. No ano passado, o excesso de capacidade mundial na produção de aço foi de 619 milhões de toneladas, frente a um consumo de 1,853 bilhão de toneladas.

Enquanto isso, no Brasil, o vencimento do prazo do sistema de cota-tarifa se aproxima do fim. A medida foi implementada no meio do ano passado para tentar conter a avalanche de importações, com duração de 12 meses. Para as NCMs que estão dentro desse controle, a cota é calculada com base na média de importação entre 2020 e 2022, acrescida de 30%. Se as compras ultrapassam esse número, o tributo de importação cobrado, que gira em torno de 10,8%, passa a ser de 25%.

A sobretaxa, por sua vez, não é tão efetiva para controlar o que desembarca no Brasil devido ao preço que companhias chinesas, que contam com subsídios estatais, conseguem fazer, aponta o setor. Nesse quesito, a desaceleração da economia da China também tem gerado impacto. Na bobina a quente, o preço de exportação do país caiu de US$ 560 por tonelada em janeiro de 2024 para US$ 464 por tonelada em março deste ano. O subsídio dado pelo Estado chinês para as empresas vem crescendo ao longo dos últimos anos. Em 2023, o valor recebido por 20 siderúrgicas chinesas foi de US$ 654 milhões.

Antes mesmo do tarifaço de Trump, os números dos primeiros três meses de 2025 já preocupavam o mercado doméstico. Inicialmente, o Instituto Aço Brasil previa um crescimento de importações de 11,5% no ano. Mas, no primeiro trimestre, o avanço já foi de cerca de 30% ante o mesmo período em 2024. Em entrevista recente ao Estadão/Broadcast, o presidente da entidade, Marco Polo de Mello Lopes, fez um alerta sobre o que irá acontecer agora que o mundo todo terá dificuldade de entrar no mercado americano. “Os EUA importaram no ano passado 26 milhões de toneladas. Se retirar os semiacabados, são 18 milhões de toneladas. A pergunta é: para onde é que vai esse volume todo?”, questionou.

Na outra ponta do problema gerado pelo tarifaço, as siderúrgicas brasileiras que exportam aos Estados Unidos tentam convencer o governo do republicano a retomar o acordo fechado no primeiro mandato de Trump. Por ele, o Brasil evitou a sobretaxa à época e podia exportar anualmente 3,5 milhões de toneladas de aço semiacabado e 687 mil toneladas de laminados aos EUA. Agora, desde 12 de março, as vendas pagam uma alíquota de 25%.

No ano passado, das 5,6 milhões de toneladas de placas de aço importadas pelos EUA, 3,4 milhões de toneladas foram do Brasil. Como o produto é usado pela indústria americana e, portanto, complementar à produção de lá, o setor acredita que a gestão Trump irá reconhecer a importância econômica de retomar o acordo fechado há praticamente oito anos. O argumento tem sido uma das tônicas da negociação entre as diplomacias brasileira e americana. A reunião mais recente aconteceu na quinta-feira, 10.

Fonte: Estadão
Seção: Siderurgia & Mineração
Publicação: 22/04/2025